Castanha típica do Cerrado, o baru (Dipteryx alata) vem conquistando cada vez mais espaço, dentro e fora do país, com alto valor agregado. Isso porque, além do ótimo sabor, e de seus comprovados benefícios à saúde, o fruto do baruzeiro possui um forte componente socioambiental.
O assunto foi abordado na “1ª Oficina para o Comércio Justo e Solidário da Cadeia do Baru”, durante o IX Encontro e Feira dos Povos do Cerrado. Organizada pela Cooperativa de Agricultura Familiar Sustentável com Base na Economia Solidária (Copabase) a oficina contou com financiamento do Fundo de Parceria para Ecossistemas Críticos (CEPF) Cerrado e apoio da Ecoa, entre outras instituições.
No Cerrado, o extrativismo do baru, tem promovido a geração de renda, autonomia e o resgate da autoestima dos agricultores familiares extrativistas. Um processo virtuoso que ajuda a fixar as famílias e os jovens no campo, contribuindo de maneira direta na conservação do bioma.
Para a extrativista e diretora do Centro de Produção, Pesquisa e Capacitação do Cerrado (Ceppec), Rosana Sampaio, “as comunidades estão por dois motivos trabalhando com o baru: um é o principal deles, a conservação dessas espécies, desse modo de vida, a preservação do local em que nós vivemos. Porque nós queremos deixar pros nossos filhos, um ambiente equilibrado, e nós lutamos por isso. E a outra é que precisamos fomentar para permanecer existindo ali, precisamos da geração de renda”.
Criado em 2003, por iniciativa das mulheres artesãs do Assentamento Andalucia, o Ceppec coordena uma rede de 45 famílias que trabalham com a coleta do fruto. O Centro é referência no processamento e comercialização da castanha no país.
Com tamanho médio de 15 metros, o baruzeiro tem associado a ele uma importante fauna de polinizadores e dispersores de sementes. Isso faz com que sua proteção, tenha grande importância para os ecossistemas do Cerrado.
Mas nem sempre foi assim. Dionete Figueiredo, gestora da Copabase, conta que “na década de 1980, onde o carvão predominava para a economia regional, o baru foi drasticamente retirado da vegetação. Os poucos que sobraram hoje já não são mais cortados, por conta do viés econômico que representam para a região (noroeste de Minas Gerais)”.
A situação era semelhante na alta bacia do Rio Miranda. Altair de Souza, agricultor familiar e extrativista do Ceppec, relembra o final dos anos 1990, quando chegaram ao Assentamento Andalucia, localizado na área rural do município de Nioaque (MS), “o único conhecimento que a gente tinha a respeito do baru era seu aproveitamento madeireiro, e muitas árvores foram derrubadas para construção de cercas”.
O aporte de pesquisadores, universidades e organizações que trabalham pela conservação do Cerrado, foi fundamental para que as populações do bioma conhecessem e se reconhecessem como parte do território, valorizando seu potencial e descobrindo o quanto o baru poderia ser rentável.
Um dos principais fatores que contribuem para a manutenção desse sistema é o chamado comércio justo (Fair Trade). Uma forma de organização alternativa ao sistema tradicional de comércio, que preza, entre outras coisas, pela transparência, relações de longo prazo entre produtores e compradores e conservação ambiental. O objetivo é garantir melhores condições de troca e direitos a produtores e trabalhadores em desvantagem comercial e/ou marginalizados.
Entre as apresentações, rodas de conversa e trabalhos em grupo, da 1ª Oficina para o Comércio Justo e Solidário da Cadeia do Baru, produtores, representantes de povos tradicionais, compradores, varejistas, trabalhadores de cooperativas, pesquisadores, chefs de cozinha e representantes de organizações que trabalham pela conservação do Cerrado, puderam identificar juntos os principais desafios para o crescimento sustentável da produção do baru, como a falta de inovação tecnológica, principalmente na quebra da castanha – um processo muito trabalhoso e duro – e a necessidade de capacitação dos produtores e coletores.
Pesquisadora na ONG Ecoa e coordenadora da Rede de Mulheres Produtoras do Cerrado e Pantanal (CerraPan), Nathalia Ziolkowski, pontua que “a ampliação da produção depende mais da demanda pelo produto, e também do fortalecimento do trabalho conjunto e colaborativo da comunidade”. Um processo que segundo Ziolkowski, muitas vezes esbarra na desvalorização de alimentos naturais e regionais, e na burocracia para chegar ao mercado.
Dionete Figueiredo, explica que a dinâmica da cadeia produtiva do baru, começa com os extrativistas que coletam o baru (tanto em suas propriedades, como em outras regiões), beneficiam o fruto de maneira manual e artesanal e entregam para a cooperativa ou associação. Ali a castanha passa pelo processo de torra, envasamento e rotulagem, a fim de alcançar o padrão que o mercado requer. Em 2018, a Copabase comercializou 10 toneladas da castanha de baru, e a estimativa é de chegar a 15 toneladas em 2019.
A chef de cozinha Ana Paula Boquadi, do restaurante Buriti Zen, defende que “o segmento gastronômico deve fortalecer a cultura alimentar do Cerrado e valorizar os saberes tradicionais dos agricultores extrativistas. Utilizar esses ingredientes de forma sustentável e remunerar de forma justa esses agricultores são iniciativas que ajudam a manter nosso bioma em pé”.